E se?
E se as mentiras forem verdade
E as verdades forem meras formalidades
E as formalidades forem necessárias
E as necessidades forem supérfluas
E as superfluidades forem luxo
E se o luxo for fútil
E a futilidade for precificada
E a precificação for filosófica
E a filosofia perder a capacidade de perguntas
E se as perguntas não puderem ser feitas aos políticos
E os políticos pertencerem todos ao mesmo partido
E se os partidos fossem apenas filhos do mesmo pai
E esse pai for o sistema político
E se esse sistema for corrupto
E a corrupção for generalizada
E se ela for invenção da justiça
E a justiça não existir
E a existência for uma mentira
E a mentira for verdade
Ou as verdades forem de mentira
O que você faria?
– Gerson Christianini
Se
Se és capaz de manter a tua calma quando
Todo o mundo ao teu redor já a perdeu e te culpa;
De crer em ti quando estão todos duvidando,
E para esses no entanto achar uma desculpa;
Se és capaz de esperar sem te desesperares,
Ou, enganado, não mentir ao mentiroso,
Ou, sendo odiado, sempre ao ódio te esquivares,
E não parecer bom demais, nem pretensioso;
Se és capaz de pensar — sem que a isso só te atires,
De sonhar — sem fazer dos sonhos teus senhores.
Se encontrando a desgraça e o triunfo conseguires
Tratar da mesma forma a esses dois impostores;
Se és capaz de sofrer a dor de ver mudadas
Em armadilhas as verdades que disseste,
E as coisas, por que deste a vida, estraçalhadas,
E refazê-las com o bem pouco que te reste;
Se és capaz de arriscar numa única parada
Tudo quanto ganhaste em toda a tua vida,
Eperder e, ao perder, sem nunca dizer nada,
Resignado, tornar ao ponto de partida;
De forçar coração, nervos, músculos, tudo
A dar seja o que for que neles ainda existe,
E a persistir assim quando, exaustos, contudo,
Resta a vontade em ti que ainda ordena: “Persiste!”;
Se és capaz de, entre a plebe, não te corromperes
E, entre reis, não perder a naturalidade,
E de amigos, quer bons, quer maus, te defenderes,
Se a todos podes ser de alguma utilidade,
E se és capaz de dar, segundo por segundo,
Ao minuto fatal todo o valor e brilho,
Tua é a terra com tudo o que existe no mundo
Eo que mais — tu serás um homem, ó meu filho!
– Rudyard Kipling
Quem reclama muito
Muito reclama da vida
Vida se esvai sem saída
Saída não há, pois escrita
Escrita se faz no labor
Labor com lágrimas e com dor
Dor de quem sabe reconhecer
Reconhecer que pra quem luta
Há valor
– Gerson Christianini
Anos de saudades
Saudades, lá fora, que ardem, que vivem
Presente efervescente na memória
Que julga ser lugar onde mora
Quem dera se fosse faísca, folha e história
Escuros; castanhos escuros são seus olhos
Que escureciam as tristezas
E cujo sorriso curava o tempo
Cuja alegria intimidava o silêncio
Sim, o silêncio, tão desejado pelos sábios,
Tão demasiadamente pregado pelos eruditos
Esperava você falar, e, clamava em ser seu amigo
Porque, linda, pra você, é adjetivo limitado, antigo
Ah, quem diz que felicidade é estado de espírito
Que apenas brota no profundo, no interior
Não te conheceu, para saber, e aprender
Que sua beleza é remédio indolor
Passaram-se meses e alguns anos
Sim, vários anos, que se foram, que não voltam
Mas ainda sinto o seu perfume passando perto
Sua voz, seu tom de voz, escuto por certo
Mesmo longe, saudades, está passando
Não lhe esqueci, com seu coração sem maldades
Linda e meiga cantarolando, com poemas nos lábios
Dizendo: prazer, eu vim lhe dizer, que também tenho saudades
Deixa eu lhe pedir, vento, que me trouxe saudades
Traga-me tudo, menos vaidades,
Para respirar a vida, sem truques
Sem temor e irresponsabilidades
Só que, ventos, passem lá também
E a mesma alegria que deixou aqui, deixe lá, com ela, porém
Um pedido, de alma, ó ventos amigos e auspiciosos
Não deixe nós se encontrarmos de novo, amém– Gerson Christianini
Quem sabe
Quem sabe, soube aprender
Quem soube, pensou em saber
Quem não sabe senta e aprende
Porque na vida quem sabe não depende
Quem não sabe se arrepende
Quem sabe vira gente
– Gerson Christianini
Sabe o sucesso?
Ele existe, ele tem endereço
Ele é de carne e osso
Não é um adereço
Ele não é um bicho-papão
E sempre aparece pro homem
Que trabalha feito leão
Só que muito cuidado
Ele não é de brincadeira não
Ele prega peças
E escorrega feito sabão
– Gerson Christianini