Digito Marília no Google. A internet não me ajuda muito, está lenta, mas aparecem as seguintes informações: temperatura, 31 graus; umidade relativa do ar, 57%; ventos de 8 km/H. Fiz essa busca por curiosidade. A sensação de calor era eloquente em me informar que o dia estava quente. Avisto, em meio ao deserto de asfalto, debaixo das árvores, com aparência simpática, um vendedor de garapa de cana.
Afirmar que é um oásis no deserto não é absurdo. Desço com minha máquina a tiracolo. Acho que a máquina intimida um pouco. Chama a atenção e pode tirar a espontaneidade. Mas lá vou eu descobrir mais uma história de vida, mais um exemplo de Marketing. O local é muito bem cuidado e agradável.
Descubro que o nome do dono e Cícero. Com aquele calor não resisto, e pergunto se os dias mais quentes facilitam a venda, e ele me responde que, em dias frios nem vai trabalhar. A Kombi estacionada de portas abertas aguarda os transeuntes cansados da lida. Entre a rodovia e a rua paralela, ele oferece, não um caldo de cana, mas um refrigério para o calor, um descanso da labuta. Com alguns minutos já percebo que a estrada propicia a ele muitos amigos. Buzinadas e acenos de mão de mão são frequentes entre aqueles que passam a 80 km na rodovia, quando estão respeitando a velocidade permitida, óbvio.
Pergunto a ele sobre o movimento da rodovia em comparação com o movimento do local. Ele me diz que poderia ganhar mais dinheiro por informação do que com a garapa. O local é bem cuidado. Na breve conversa que tive com ele, duas reclamações foram incisivas. “Há muito vandalismo”, confidencia ele. Há uma escada bem feita, e uns bancos de madeiras bem dispostos. O Sr. Cícero mesmo que fez. Só que ele me mostra com tristeza uma árvore que foi avariada por vândalos.
Encontro ali salgadinho, caldo de cana e paçoca. São 64 anos de idade, e mesmo assim ele continua firme. Reclama da depreciação e corrosão do dinheiro. “Há 12 anos atrás 1 salário mínimo valia como 3 salários de hoje”, diz ele, que frequentemente ouve reclamações sobre a economia. “Aqui é um ponto onde se conta coisa boa e coisa ruim; tenho escutado muita reclamação, principalmente sobre desemprego; aumentou muito”, conta ele, que mesmo com a crise tão propalada, não subiu o preço do produto. “Prefiro ganhar na quantidade”, arremata Sr. Cícero.
Sombra e caldo fresco. O som ambiente é o zunido dos carros e caminhões que passam com ímpeto e peso pela rodovia. O jaleco branco e as luvas dão o tom de limpeza e segurança ao cliente. O “Tiozinho”, conforme ele mesmo disse que é conhecido, fala num tom baixo e tem uma risada tímida, além de não fica parado por um minuto. Enquanto os clientes não chegavam, lá estava ele desfiando a cana.
Faço minhas anotações, tiro algumas fotos, e vou indo embora. Noto que 2 clientes ficaram ali o tempo todo, sem falar muito. Apenas descansando na sombra e desfrutando do caldo de cana. Como há um ponto de parada de ônibus próximo ao local, muitos esperam sentados nos bancos feitos pelo Sr. Cícero.
Ele me contou sobre a clientela, e me disse que de domingo o local lota, com as famílias curtindo o dia de descanso com um bom caldo de cana. Tudo contribui para uma boa comunicação. E, muitas vezes, a comunicação não é a falada, mas a apresentada. O marketing do Sr. Cícero não está presente no megafone. Não é preciso anunciar aos quatro cantos da cidade sobre o sabor do caldo de cana.
Os que passam e avistam o local, se sentem persuadidos não apenas pela Kombi com o anúncio do caldo de cana. A árvore e sua respectiva sombra, os bancos bem dispostos, o clima de descanso e a aparência relativamente rústica contribuem para o Marketing do Sr. Cícero. Ele não vende caldo de cana, salgadinho, paçoca. Ele vende a saudades de outro tempo e a tranquilidade em meio à balbúrdia da vida do século XXI. É o slogan de sombra e caldo de cana fresco, afinal, quem, num dia de um calor gritante, não se sente convencido por um local tão agradável? É o Marketing e suas mais variadas faces, ações e estratégias.
Autor: Gerson Christianini